Contencioso tributário brasileiro alcançou R$ 5,4 trilhões em 2020

Segundo estudo ‘Contencioso Tributário no Brasil’, produzido pelo Insper, valor representa 75% do PIB

Em meio à discussão política sobre a Reforma Tributária, o contencioso tributário no Brasil, que representa a soma de todas as discussões tributárias do país, alcançou o valor de R$ 5,4 trilhões no ano passado, número que representa 75% do PIB. Os dados são do estudo “Contencioso Tributário no Brasil”, feito pelo Núcleo de Tributação do Insper, que analisou dados referentes ao ano de 2020.

De acordo com o levantamento, a via judicial responde por 74% do estoque do contencioso, totalizando R$ 4,1 trilhões em processos. Já contencioso administrativo tributário tem o estoque de R$ 1,43 trilhão. 

O estudo também indica que a União é líder nos processos tributários em relação aos estados e municípios. No nível federal, há R$ 3,8 trilhões de contencioso tributário. O número equivale a aproximadamente 53% do PIB. O dado apresentado pela pesquisa surge em um momento de “congelamento” do avanço da reforma, já que o Congresso não está realizando a análise de projetos. 

Apesar disso, na última quinta-feira (21/1), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) reiterou que a Reforma Tributária será feita ainda em 2021. O governo também foca energias na disputa pela presidência da Câmara e do Senado, acontecimento que é considerado essencial para o avanço das discussões da reforma.

Em nível estadual, onde também existe a discussão sobre qual modelo de Reforma Tributária seria a melhor aos estados, que possuem grande parte da arrecadação com base no ICMS, o contencioso tributário no Judiciário tem o valor de R$ 917 bilhões. Na via administrativa, o valor é de aproximadamente R$ 260 bilhões. 

Nas capitais do país, a discussão tributária também alcança valores bilionários. Os processos no Judiciário totalizam R$ 251 bilhões. O valor pode ser ainda  maior, já que duas capitais – João Pessoa e Campo Grande – não enviaram os dados aos pesquisadores. Administrativamente, o valor das discussões tributárias é de R$ 17 bilhões nas capitais. Entretanto, somente 10 capitais tinham os dados disponíveis.   

Segundo o tributarista Breno Vasconcelos, um dos pesquisadores do estudo, que teve coordenação de Vanessa Rahal Canado, assessora especial do ministro da Economia, Paulo Guedes, e pesquisadora do Insper, já era esperado que a União liderasse o contencioso tributário em relação a estados e municípios, por ser a maior arrecadadora. “Ademais, a União arrecada muito para repassar a estados e municípios. Isso acontece, por exemplo, no IPI e no Imposto de Renda”, afirmou. 

Além disso, o tributarista explica que a União é o ente federativo que mais divulga os dados tributários. “Por ausência de informações, e não pela falta de tentativas, não conseguimos ainda mensurar de forma muito precisa qual o contencioso dos demais entes”, afirmou Vasconcelos. Em relação aos municípios, por exemplo, excluindo as capitais, nenhum outro compartilhou dados sobre o contencioso tributário administrativo. 

O grupo de pesquisadores do Insper criou o canal de comunicação observatoriodocontencioso@insper.edu.br para que entes federativos enviem informações, dados, atualizações e medidas adotadas para reduzir o atual contencioso tributário.

Frente aos dados, porém, Vasconcelos não acredita que atualmente existe uma concentração de processos tributários na via judicial, com poucos processos discutidos administrativamente. “A via administrativa deságua na judicial. Uma vez percorrido o trâmite no processo administrativo, o contribuinte pode levar o caso ao Judiciário. A Fazenda Pública pode encaminhar a dívida, inscrevê-la em dívida ativa e, portanto, cobrar judicialmente“, explicou o tributarista.

Contencioso x Arrecadação

A pesquisa também mostra a relação do estoque total de contencioso de determinados tributos e a arrecadação dos mesmos. 

O estoque de contencioso do IRPJ, líder da tabela, representa 813% do valor que se arrecada anualmente com o mesmo tributo. O número indica que, com a atual arrecadação do tributo, seria necessário um período de oito anos para alcançar o valor total do contencioso tributário do imposto, explica Vasconcelos. 

No caso do ICMS, por exemplo, o estoque de contencioso representa 136% do que se arrecada ao ano com o tributo, liderando a tabela de tributos estaduais.

“Chama atenção casos como o da Cofins, cuja relação entre contencioso e arrecadação é de  314%. É um tributo relativamente novo e o total de contencioso já representa 314% do que se arrecada anualmente. Com isso, seria necessário um período de três anos para liquidar o estoque sem nenhum novo processo entrando”, afirma Vasconcelos. 

No nível municipal, o total de estoque de contencioso do ISS, por exemplo, representa 144% da arrecadação anual com o mesmo tributo. No sistema tributário brasileiro, a CSLL tem a taxa de 479%, o IPI tem 423% e o IRPF 360%. Para Vasconcelos, os números mostram a necessidade de uma mudança estrutural no sistema tributário. 

“Temos acompanhado medidas para a redução de contencioso, como transação tributária, programas de parcelamento, medidas adotadas pelos fiscos para diminuição do ajuizamento de execuções fiscais. Todas essas ações são positivas, mas são insuficientes para resolver o problema do contencioso tributário no Brasil”, concluiu Vasconcelos. 

ALEXANDRE LEORATTI – Repórter em Brasília. Faz parte da equipe de Tributário, com foco na cobertura do Carf, PGFN e Receita Federal. Antes de atuar em Brasília, foi repórter do JOTA em São Paulo. Email: alexandre.leoratti@jota.info

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